quinta-feira, 23 de abril de 2009

Ele ontem chegou mais tarde do que é normal, e confesso que isso me inquietou. Tive medo que ele se tivesse ido embora como tu foste, da mesma forma repentina e cruel. Meteu a chave na porta bem devagarinho, pensando ele que eu estava a dormir, e de facto estava, contigo. Deixei-me estar quieta, para não mudar o rumo daquela noite. Não me apetecia ter que o deixar despir-me, nem ter que o ver satisfazer-se de mim. Não era por obrigação não, era outra coisa. Acho que hoje percebo que o único mal que nos assombra, é a minha falta de amor para com ele, e o amor dele em exagero para comigo. A culpa foi minha, que o deixei julgar que ia resultar. Dei-lhe esperanças numa noite quando, entre álcool e drogas, o afastei dos lençóis e lhe despi o pijama. Lembro-me que dormia só com uma t-shirt o que me fartou o trabalho. Não estava certamente em condições de ser carinhosa, por isso fiz o que me apeteceu fazer, e adormeci. Arrependi-me no segundo depois, de lhe ter voltado as costas, e me ter lembrado de ti. Fi-lo para te arrancar de mim, para te esquecer, para te sobrepor, chama-lhe o que quiseres, de nada resultou. Ele tentou aconchegar-se a mim, e eu só consegui pular dali para fora, e meter-me num banho gelado. E á medida que a água ia escorrendo, só conseguia imaginar as tuas mãos a percorrerem o meu corpo naquelas entregas de horas. Na forma como te encostavas na parede, e colocavas os teus braços á volta da minha anca, puxando-me para ti num gesto decisivo e arrepiante. Tento pensar até que ponto é que era mau não te ter ali sempre, no banho, na cama, no sofá, do outro lado do telefone, ou na esplanada da praça. Penso e repenso, e a única coisa que me ocorre é que não era mau, era espaçoso. Dava-nos liberdade, e espaço para as saudades crescerem. E era tão bom a cada encontro. Era como de tivesses um novo brilho no olhar, como se o meu sorriso fosse mais esplendoroso. De repente ele entrou na casa de banho, e parou-me o sonho. Foi como se tivesse descido á terra da forma mais brusca que pode existir. Aquela voz em que eu tanto quis acreditar, não era a tua. Encheu-me de beijos, mimos e frases feitas, daquelas melosas que os homens decoram quando querem convencer-nos que estão deliberadamente apaixonados e eu tive que me deixar levar. Chego ao ponto de o detestar, de tanto que o quis amar. Não consegui, ainda te tenho demasiado em mim amor.

1 comentário:

  1. 'Não consegui, ainda te tenho demasiado em mim amor.'

    O problema acaba por ser sempre esse. O facto de termos tão presente outra pessoa em nós não nos deixa seguir em frente e não nos deixa abraçar o futuro com a força que devíamos.

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